A agonia invisível de um povo esquecido nas ruínas de Gaza, no silêncio do mundo

Querido(a) leitor(a) do Cartas Gospel, Escrevo-lhe hoje com o coração profundamente perturbado,

Querido(a) leitor(a) do Cartas Gospel,

Escrevo-lhe hoje com o coração profundamente perturbado, enfrentando a angústia de colocar em palavras aquilo que os olhos da humanidade fingem não ver. Enquanto leio o artigo publicado pelo The Guardian, intitulado “‘O mundo não se importa se todos nós morrermos’: fome e desespero nas ruínas da Cidade de Gaza”, algo dentro de mim se rompe. Uma dor aguda, semelhante àquela que sentimos quando a injustiça se arrasta aos gritos pelas vielas do sofrimento humano — e ninguém responde.

A reportagem, assinada por Jason Burke e Malak A Tantesh, é um grito abafado que ecoa entre os escombros de uma cidade devastada. Não é uma peça jornalística comum — é uma crônica do abandono. As palavras não descrevem apenas um cenário de guerra; elas pintam o retrato do inferno na Terra. Gaza, uma cidade outrora viva, tornou-se um campo de deslocamento em massa, fome extrema e tristeza insuportável. E o mundo? Ah, o mundo continua a discutir acordos, fronteiras, culpados. Enquanto isso, mães enterram seus filhos com as próprias mãos.

Como cristãos, não podemos desviar o olhar.

Não é possível manter o coração frio diante do testemunho do pai de família, Mohammed Abu Nadi, que fugiu com sua esposa e filhos após ver seu vizinho retornar para casa apenas para encontrá-la reduzida a pó — junto com sua esposa e crianças. Ele não viu alvos militares, não viu soldados, não viu resistência. Apenas corpos de inocentes, esmagados sob os escombros de uma guerra que parece não ter fim — e que insiste em punir quem menos merece.

Mais de 100 mil pessoas fugiram para Gaza City nas últimas semanas, não por escolha, mas por absoluta falta de opção. Homens, mulheres, crianças… todos vivendo em condições que mal se comparam à dignidade humana. Eles dormem sobre pavimentos rachados, cobertos por lonas improvisadas, cercados por mosquitos, sem água potável, sem remédios, sem pão. Sem esperança.

O som do mar ao oeste — ondas que antes embalavam sonhos e orações — agora disputa espaço com as explosões e os bombardeios. Os relatos de Abu Adam Abdul Rabbo, que perdeu mais de 80 familiares, incluindo cinco parentes numa única noite, são dilacerantes. Sua esposa, em desespero, perguntava: “Como vamos sobreviver?”.

Querido(a) leitor(a), pare por um instante. Feche os olhos. Imagine sua casa. Sua esposa. Seu filho de oito anos, quadriplégico, como o pequeno Yazan, que está definhando lentamente por falta de comida e cuidados médicos. Imagine não poder fazer nada. Apenas ver, impotente, a vida escorrer diante dos seus olhos, como areia por entre os dedos.

Agora tente imaginar o silêncio do mundo.

A reportagem do The Guardian relata que a fome se instalou como uma praga. A ONU confirma: há risco crítico de fome em Gaza. Os armazéns estão vazios. Os fornos de caridade, que sustentavam parte da população, fecharam. Comer virou um luxo. Um quilo de tomates custa o equivalente a R$ 70. Setenta reais por um punhado de acidez em meio ao desespero. Setenta reais que ninguém tem.

As clínicas não têm mais 40% dos medicamentos considerados essenciais. Médicos relatam abscessos, diarreias agudas, doenças respiratórias, feridas abertas, corpos que desfalecem por inanição. A descrição do Dr. Iain Lennon, médico britânico, é clara: as pessoas não estão apenas feridas — elas estão famintas. Cansadas. Desorientadas. E ainda assim, continuam caminhando, arrastando crianças pelas ruas de entulho, buscando a promessa de ajuda que raramente chega.

E quando chega, é saqueada. Um comboio de ajuda humanitária com 20 caminhões carregando trigo foi atacado por saqueadores. Apenas três chegaram ao destino. Não porque o povo de Gaza é bandido, como alguns querem pintar, mas porque a lei e a ordem desmoronaram junto com as escolas e hospitais. Porque a fome transforma qualquer pai amoroso em um lobo desesperado.

O mais cruel? A ajuda está logo ali. Há 130 mil toneladas de mantimentos a poucos quilômetros de Gaza. Do outro lado do muro. Do outro lado da diplomacia. Do outro lado do medo.

E enquanto isso, o mundo debate. Espera. Analisa. Negocia. Como se houvesse tempo para esperar quando uma criança morre por dia.

O plano apoiado pelos Estados Unidos, que pretende entregar comida por meio de pontos controlados por contratados privados sob proteção de tropas israelenses, parece mais uma simulação de ajuda do que uma operação real de socorro. Os palestinos terão de viajar 40 quilômetros por ruas destruídas, em meio à guerra, sem transporte algum, para receber 20kg de mantimentos. Como? Com que forças? Quem carrega um filho ferido e uma sacola de comida ao mesmo tempo, em plena zona de guerra?

Segundo o ativista Amjad Shawa, essa é uma “estratégia engenheirada” para forçar o deslocamento e esvaziar o norte de Gaza. E os mais frágeis pagam a conta.

Ihab al-Attar, pai do jovem Mahmoud, de 21 anos, está cuidando sozinho do filho, que perdeu parte do intestino após ser atingido por um míssil. Sem hospitais, sem antibióticos, sem curativos. Apenas fé. Mas até a fé, quando emparedada entre a fome e a morte, começa a se calar.

E eu me pergunto, em voz alta: Onde estamos nós?

Sim, nós, cristãos. Aqueles que seguem o Príncipe da Paz, o Cordeiro de Deus, Aquele que nos ensinou: “o que fizestes a um destes pequeninos, a mim o fizestes.” (Mateus 25:40)

Estamos muito ocupados defendendo lados políticos? Muito ocupados justificando ataques com teologia rasa ou com a segurança de um sofá ocidental? Estamos tão cauterizados que nos tornamos insensíveis à imagem de Cristo presente nos escombros de Gaza?

Porque ali, entre o sangue e o pó, Cristo está. Sim, está. Em cada criança mutilada. Em cada mãe que chora. Em cada pai que cava com as mãos o túmulo do filho. Ali está Aquele que também foi rejeitado, esmagado, crucificado por um sistema que não suportava sua verdade.

E nós? Continuaremos olhando para o outro lado?

Esta carta não é para acusar, mas para despertar. Despertar o corpo de Cristo para a compaixão que Ele mesmo viveu. Para a misericórdia que Ele nos ensinou a oferecer mesmo ao inimigo. Para o amor que não se limita a fronteiras, nem a bandeiras, nem a narrativas pré-fabricadas.

Não precisamos concordar com políticas. Mas devemos chorar com os que choram. Precisamos, urgentemente, retomar a empatia.

Gaza não é uma causa política. Gaza é uma ferida aberta na carne da humanidade. Gaza é uma pergunta que o Céu nos lança: “Onde está o teu irmão?” (Gênesis 4:9)

Sim, talvez não possamos mudar tudo. Talvez não possamos entrar com caminhões de ajuda. Mas podemos orar. Podemos interceder com profundidade, com lágrimas, com jejum. Podemos clamar por um cessar-fogo. Podemos pressionar nossos líderes. Podemos doar para agências sérias que atuam no local. Podemos ensinar nossos filhos que a vida humana vale mais do que ideologias.

Podemos, sobretudo, não nos calar.

O silêncio da igreja é um dos sons mais ensurdecedores da atualidade.

Finalizo esta carta com as palavras da senhora Umm Ammar Jundiyea, de 65 anos, mãe de oito filhos, refugiada em Gaza City: “O mundo não se importa com o que está acontecendo em Gaza, mesmo que todos nós morramos. Este mundo é enganador e hipócrita. Diz ser civilizado e humano, mas só enxerga com um olho.”

Que não sejamos esse mundo.

Que sejamos a luz. Que sejamos o sal. Que sejamos o corpo que sangra junto. Que sejamos a voz que clama no deserto.

Que sejamos como Cristo.

Com informações The Guardin

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Romanos 13:1-2

1 Todos devem sujeitar-se às autoridades governamentais, pois não há autoridade que não venha de Deus; as autoridades que existem foram por ele estabelecidas. 2 Portanto, aquele que se rebela contra a autoridade está se opondo contra o que Deus instituiu, e aqueles que assim procedem trazem condenação sobre si mesmos.

Isaías 10: 1-3

1 Ai daqueles que promulgam leis iníquas, e todos que elaboram decretos opressores, 2 a fim de privar os pobres dos seus direitos e evitar que os oprimidos do meu povo tenham pleno acesso à justiça, transformando as viúvas em presas de suas ambições e despojando os órfãos! 3 Pois bem, que fareis no Dia do Castigo, quando a destruição vier de um lugar distante, mas certeira? A quem correreis em busca de abrigo e socorro, onde deixareis as vossas riquezas,…

Leandro G. Veras

Cartas Gospel

Alcançado pelo evangelho de Jesus Cristo em 1979 e, desde então, apaixonado pela Palavra de Deus.  Compromisso é comunicar a Verdade com amor e convicção, inspirando e esperança em Cristo.

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